© 2024 por Flávia Junqueira.
Da potência imaginativa do infantil à poesia como experiência
O universo mágico e inventivo aqui oferecido faz parte do percurso de Flávia Junqueira. São obras que atravessam o período dos últimos cinco anos, em uma combinação de trabalhos que inclui fotografias de teatros, bibliotecas e monumentos icônicos, sempre com a presença de balões de látex que ressignificam esses espaços históricos e criam uma atmosfera de sonho e encantamento.
O que se coloca em cena é algo da ordem do infantil no sentido psicanalítico, tratando-se portanto de uma exposição que abriga o adulto e a criança. Para a psicanálise, o infantil não está circunscrito à criança e a artista empreende a tarefa de reinventar o olhar brincante, o êxtase da experiência. Olhar para o infantil nas cenas e trabalhos aqui expostos implica falar de origens e tocar uma dimensão mítica, a partir da imersão em outra atmosfera e estrutura de presença.
Flávia Junqueira cria ambientes em que se pode fabular o mundo através de uma mirada mágica. Com balões de acrílico, luzes de parque de diversão, cortinas de teatro e cavalos de carrossel a artista recria aquilo que Cecília Meireles anuncia na poesia: “Enquanto não têm foguetes para ir à lua, os meninos deslizam de patinete pelas calçadas da rua”. Fazer com o que que se tem à mão: na refundação do mundo a artista cria uma atmosfera cênica fulgurante que dialoga diretamente com as fotografias, a estrutura de seu trabalho artístico. A imantação do espaço pelas instalações cria um salto de linguagem. Da fotografia às instalações que envolvem o público – chamado a mergulhar em uma dimensão que a vida protocolar ignora – um território de magia é revelado.
No livro “Reflexos sobre a criança, o brinquedo e a educação”, Walter Benjamin cita que “a máscara do adulto chama-se experiência”, mas o que o adulto chama de experiência é inexpressivo e impenetrável e, portanto, é preciso acessar a dimensão mais profunda, complexa e densa da experiência. “Extasia” faz a mesma convocação e, ao reinventar a experiência, algo do êxtase pode se colocar como epifania. Se o adulto descreve sua experiência, a criança utiliza a repetição típica da brincadeira como forma de elaboração de suas experiências e também se vale da possibilidade investigativa e fabulatória, como aqui ofertado pela artista.
Na abertura para o infantil que não concerne somente à infância, o trabalho de Flávia pulsa e nos convida a olhar de outra maneira, rompendo as formas petrificadas dos hábitos. Assim disse Drummond: “Vou ao circo para me sentir em casa com o mundo”. Para instaurar outro tipo de presença, Flávia penetra espaços históricos e arquitetônicos, salões nobres, platéias, palácios, edificações barrocas ou em ruínas.
O balão – que para a artista tem função pictórica e disruptiva – se insere nas fotografias como elemento de teatralidade e fabulação. Em festas e parques de diversão, o balão – efêmero e frágil – contempla a lógica do anti-monumento, se contrapondo a espaços monumentais e históricos. O balão é a festa, faz parte do imaginário coletivo e também da cultura popular.
Está presente na memória das pessoas, através de lembranças que marcaram a infância. É um elemento flutuante como a bola do poema de Dylan Thomas: “A bola que lancei quando brincava no parque ainda não tocou o chão”. O balão está sempre em suspenso, sua vitalidade é essa suspensão aerada, certa leveza que permite que as coisas no entorno percam um pouco de gravidade.
Os balões, carrosséis, brinquedos e parques de diversão retratados pela artista condensam a irradiação da cor – sempre trabalhada de forma primorosa – e a impressão fina do ritmo das imagens que habitam o sonho, a fantasia, o chamamento à poesia. Redemoinhos de significados pulsionais se abrem na matéria viva que se carrega na memória.
Revisitar as raízes da infância é uma forma de articular e integrar diferentes modalidades sensoriais. A riqueza do mundo sensível da criança – essa espécie de “originário incessante” – é fonte de criação e de descoberta, como descreve Johan Huizinga, historiador holandês que, no livro “Homo Ludens” de 1938, destaca a importância da brincadeira na cultura e afirma que “é no jogo e pelo jogo que a civilização surge e se desenvolve”. Charles Baudelaire, no magistral ensaio sobre a “Moral do brinquedo” localizava, no convívio da criança com os brinquedos, também os primeiros sinais de uma predestinação literária ou artística. Na aparente simplicidade das crianças há muita capacidade de improvisação que pode captar o que nos escapa por desatenção.
Espaços reais e oníricos – como o Real Gabinete Português de Leitura ou um parque de diversões – abrigam imagens inventadas que transitam pela dimensão do infantil, sonho e fantasia. Prenhes da “memória das coisas”, criam um universo – flexível, móvel, desdobrável – em uma delicada zona de interseção, uma potente experiência em que se aglutinam o jogo, o lúdico e a brincadeira. Nisso seu trabalho se aproxima de propostas artísticas que marcaram o século XX – de Van Gogh a Renoir, das garatujas de Cy Twombly às fotografias de imagens de museus com crianças, que mostram a dimensão da fresta. De um olhar movediço e que não se deixa capturar por obviedades – como nas belíssimas obras de Sabine Weiss ou Herb Slodounik – a temática da infância aparece não como estado fixo, mas como corpo mutante que leva a uma interrogação constante sobre o visível e o invisível. E essa é a zona para onde arte e infância convergem e que a artista faz cintilar, ao acessar regiões em que os sentidos encontram-se em estado de porosidade e ainda não estão prontos.
O balão – possibilidade da vertigem e do sonho – e os brinquedos transformam e refundam o jogo de presença-ausência de maneira mágica e, ao tocar o inefável e a experiência do mistério, colocam a infância como ponto fulcral de sua obra. A arte permite que o mistério dos primeiros tempos nunca se dissipe. Como no infinito da poesia de Louise Gluck, “olhamos para o mundo uma vez, quando crianças. O resto é memória”.
Projeto Contemporâneas Vivara apresenta instalações inéditas de Flávia Junqueira
A partir de 14 de setembro, o Parque Ibirapuera recebe obras imersivas
na primeira exposição ao ar livre da artista
Crescer e sonhar parecem ser verbos que se distanciam à medida que os anos passam. A criança habita um tempo sempre presente que se estica: com uma percepção dilatada, os minutos se arrastam em horas que se arrastam em dias, as coisas pequenas são grandes e as sensações, à flor da pele. A infância é o lugar onde a imaginação e a realidade se embaralham, criando um mundo mágico de possibilidades infinitas. Movidas por um sonhar que não vê contornos, a criança busca ser genuína consigo mesma e, a todo momento, experimentar a vida pela primeira vez.
Ao subir no palco da vida adulta, o tempo passa a exercer sua função cronológica, conforme é concebida no cotidiano, escorrendo pela ampulheta no tique-taque do despertador. As horas e os dias parecem estar em descompasso com os sentimentos, um tempo regido por humores e sensações subjetivas. A alegria e o prazer são geralmente acompanhados pela sensação de passagem rápida do tempo; enquanto a tristeza, o medo e a espera parecem fazer de cada minuto um século.
A saudade — palavra tão cara ao português — tem na nostalgia uma forma de encontrar a criança que, sem limites, brinca e sonha dentro de nós. Para o projeto Banca Galeria 2024, o Contemporâneas Vivara convida a artista Flávia Junqueira para imaginar a sua primeira exposição ao ar livre: um parque de esculturas que transporta o seu trabalho para uma experiência tridimensional interativa-contemplativa em um conjunto coeso e harmônico.
Partindo do imaginário universal dos parques de diversão antigos, da magia dos circos e da nostalgia de uma infância romântica, a artista cria uma narrativa espacial pontuada pelos seus trabalhos e por uma experiência única, lúdica e onírica, apreciada por todas as idades. Em um tempo suspenso, crianças e adultos poderão compartilhar de um espaço criado para deixar voar livremente os sonhos.
Artista visual consagrada, Flávia Junqueira é conhecida por criar cenas onde o real e o fictício, o físico e o alegórico, o presente e o passado se combinam; onde a História se torna uma memória. Ela cria paisagens imaginárias caprichosas e festivas, nas quais mergulhamos no cenário mágico da cultura local, apreciando a beleza do tempo, ouvindo o silêncio do passado.
Para o maior parque da cidade de São Paulo, a artista imaginou um jardim de esculturas com oito instalações inéditas, pontuadas por espelhos, brinquedos, um carrossel, labirintos, cores, luzes e os famosos balões que, em suas obras, são os protagonistas que sobem ao palco, seja ele a rua ou o céu. Tirando a realidade de seu eixo, Flávia constrói um espaço que permite outra experiência do real, não uma fuga, mas a suspensão de um tempo dilatado que nos lembra a beleza de poder ser criança.
Em tradução livre, a palavra rêverie pode ser compreendida como um estado agradável de perder-se nos próprios pensamentos. Da sua etimologia em língua francesa, quer dizer sonho. Para a psicanálise, é o momento de intuição do analista acerca do paciente. Essa sutileza, de saber o que se passa com o Outro, é o que a psicanálise compreende como tarefa do psicanalista no processo de manejamento da transferência.
De algum modo, essa noção proposta pela psicanálise possui certa dimensão poética, intuitiva e de horizonte metalinguístico, que também é um estado inerente à arte e ao fazer artístico. Ora, se esse não é o caminho que o conjunto de obras criadas por Flávia Junqueira para essa exposição nos sugere pensar. Não à toa, o título da mostra refere-se a uma circunstância de devaneio.
Ao adentrar a sala térrea da galeria, o visitante se depara com um carrossel flutuando no espaço. A Passarela de espelhos foi pensada estrategicamente para fornecer uma outra camada de elementos que não somente instigam o olhar, mas também evocam outras sensações. Neste lugar ocupado pelo interjogo de rêveries é que o trabalho de Flávia Junqueira atinge seu ápice. Quando ela transfere para o espectador essa profundidade poética capaz de produzir novos sentidos para o objeto de arte, e, por consequência, apontar que sonhamos e pensamos o mundo com nossas emoções.
Nesta sala, a construção cenográfica, que habitualmente orienta seu trabalho, ganha outra escala. Enquanto suas fotografias buscam a dramaticidade por meio da encenação, ao nos deparar com um brinquedo de parque de diversão in loco. É como se a artista nos colocasse como sujeitos atuantes daquilo que suas imagens nos sugerem: a criação de memórias que, para a artista, me parece acontecer no limite entre a história e a fabulação.
Ao nos fazer reconhecer algum sentimento ligado a essa cena, Flávia Junqueira estabelece um diálogo capaz de ativar ou produzir novas lembranças. Há quem irá se conectar com lugares do passado, em uma espécie de nostalgia, ou quem irá experienciar uma situação nova, que futuramente poderá ser resgatada. Independente da situação, um marco será criado e a experiência estará registrada para sempre na vida de quem entrou em contato com esse universo onírico.
Aqui, adentramos tão profundamente em nossas memórias e nos encontramos envoltos a uma magia que só a arte pode proporcionar. Criar uma ficção para que a realidade nos seja possível. E é nesse momento que a mágica acontece. Quando não há mais pretensão de desvendar o truque, mas sim, deixar-se encantar por ele. Rêverie no cerne de sua revelação.
Revelar, inclusive, é uma outra possibilidade de tradução da palavra. E essa perspectiva vem à tona no segundo andar da galeria. Ao adentrar a cortina de veludo, Flávia Junqueira apresenta um conjunto de quatro fotografias em grande formato. Ali, os elementos característicos de sua composição cenográfica ocupam o Palácio de Linares, em Madri.
Ao centro da sala, encontra-se uma peça instalativa que abriga a série “Magic Carnivals”, uma reunião de pequenos e encantadores – animais colecionáveis que, juntos, ao final da coleção, formam um carrossel. Aqui, trago a ideia de revelação não porque parece que a artista revela o processo final de uma cena que poderia ter sido capturada na sala principal – o que provavelmente será feito por muito dos visitantes. Enquanto no espaço térreo cativa-se o espectador ativando suas recordações, neste segundo espaço, surge um outro fluxo de pensamento sobre o quão manipuladas ou desmembradas podem ser nossas construções de memória. E não que isso seja algo indesejável.
Como dito anteriormente, é nesse lugar entre o real e o sonho que as memórias acontecem. E esse contraponto fica muito visível na quinta fotografia que compõe a mostra. Localizada no piso térreo, ao fundo da galeria, “Engenho de Piracicaba, 1881” traz pontos de vista que abarcam todos e traz os questionamentos levantados pela artista não só nesta exposição, mas em todo seu corpo de trabalho. Ao colocar em paralelo a ruína do engenho com a vivacidade do carrossel, interessa a Flávia Junqueira apontar que há beleza não somente na opulência dos teatros que fotografa ao redor do mundo. É também preciso olhar para aquilo que desmorona, e por que não enxergar onde reside a beleza nisso? Há de haver sempre um carrossel girando suspenso ao que está prestes a ruir.
Da potência imaginativa do infantil à possibilidade do poético por Bianca Coutinho Dias
Freud indaga se não devemos procurar na infância os primeiros traços da capacidade de imaginar. Em “Escritores criativos e devaneios”, o fundador da psicanálise aproxima a brincadeira à capacidade de invenção observada nos artistas e escritores. O trabalho de Flávia Junqueira possui essa dimensão poética própria da fantasia de origem infantil. Na sua obra, o aspecto mágico coloca em cena a possibilidade de ficcionalização da realidade que abre caminho, na imagem, para uma ligação com a potência imaginativa primeira.
Os balões, carroséis, brinquedos e parques de diversão retratados pela artista condensam a irradiação da cor – sempre trabalhada de forma primorosa – e a impressão fina do ritmo das imagens que habitam o sonho, a fantasia, o chamamento à poesia. Redemoinhos de significados pulsionais se abrem na matéria viva que se carrega na memória.
Revisitar as raízes da infância é uma forma de articular e integrar diferentes modalidades sensoriais. A riqueza do mundo sensível da criança – essa espécie de “originário incessante” – é fonte de criação e de descoberta, como descreve Johan Huizinga, historiador holandês que, no livro “Homo Ludens”, de 1938, destaca a importância da brincadeira na cultura e afirma que “é no jogo e pelo jogo que a civilização surge e se desenvolve”. Charles Baudelaire, no magistral ensaio sobre a “Moral do brinquedo” localizava, no convívio da criança com os brinquedos, também os primeiros sinais de uma predestinação literária ou artística. Na aparente simplicidade das crianças há muita capacidade de improvisação que pode captar o que nos escapa por desatenção.
Espaços reais e oníricos – como o Real Gabinete Português de Leitura ou um parque de diversões – abrigam imagens inventadas que transitam pela dimensão do infantil, sonho e fantasia. Prenhes da “memória das coisas”, criam um universo – flexível, móvel, desdobrável – em uma delicada zona de interseção, uma potente experiência em que se aglutinam o jogo, o lúdico e a brincadeira. Nisso seu trabalho se aproxima de propostas artísticas que marcaram o século XX – de Van Gogh a Renoir, das garatujas de Cy Twombly às fotografias de imagens de museus com crianças, que mostram a dimensão da fresta. De um olhar movediço e que não se deixa capturar por obviedades – como nas belíssimas obras de Sabine Weiss ou Herb Slodounik – a temática da infância aparece não como estado fixo, mas como corpo mutante que leva a uma interrogação constante sobre o visível e o invisível. E essa é a zona para onde arte e infância convergem e que a artista faz cintilar, ao acessar regiões em que os sentidos encontram-se em estado de porosidade e ainda não estão prontos.
No livro “Infância e História”, Giorgio Agamben pensa a infância não apenas como idade cronológica ou fisiologicamente definida e fechada, mas como uma forma de sensibilidade que atravessa a existência. A obra de Flávia Junqueira também abarca essa dimensão do humor e o flerte com o indomesticável e a beleza que flutua entre as imagens. O balão – possibilidade da vertigem e do sonho – e os brinquedos transformam e refundam o jogo de presença-ausência de maneira mágica e colocam a infância como ponto fulcral de sua obra, ao tocar o inefável e a experiência do mistério.
Walter Benjamin, no ensaio “Brinquedo e Brincadeira”, observa o interesse espontâneo que as crianças têm pelos resíduos dos trabalhos manuais dos adultos, como a costura e a marcenaria. A psicanálise desnaturalizou os discursos sobre a linguagem e a infância e, com a arte, podemos perceber “como uma sociedade sonha sua infância”. É neste ponto que o trabalho de Flávia Junqueira incide pois, em última instância, é sempre do infantil que se trata: o que da experiência infantil persiste como marca no sujeito, ou seja, o que permanece como matriz pelo resto da vida.
Como no infinito da poesia de Louise Gluck, “olhamos para o mundo uma vez, quando crianças. O resto é memória”. A arte permite que o mistério dos primeiros tempos nunca se dissipe e Flávia Junqueira atualiza a ideia subversiva da brincadeira como dom e dádiva.
O projeto re.UNA visa reformular a forma como as pessoas consomem, através de uma experiência única e integrada de compra, planejamento e relacionamento, o re.UNA busca estreitar laços, fortalecer conexões e impulsionar negócios. O projeto reúne diferentes segmentos dentro de um mesmo objetivo como forma de oferecer uma experiência completa a cada cliente. Sendo assim, como um projeto que celebra a singularidade, integrando compra, planejamento e o principal, relacionamento, inspiramos e conectamos as pessoas.
As marcas que fazem parte do grupo re.UNA são, Bontempo, Breton Porto Alegre, Casa LLOMA, Ladrilhart, Manjabosco Decor, Pro Marmo Pedras, Recanto Tropical Garden, Instituto Ling; todas aliadas ao projeto e de extrema importância para sua execução. Então, para materializar a proposta, nos meses de dezembro e janeiro a artista plástica Flávia Junqueira assinou uma experiência imersiva no empreendimento Frade Vilas em Angra dos Reis empreendimento com VGV de 400M voltado para o público AAA, para o mês de fevereiro de 2023. Essa experiência com instalação no Instituto Ling, se trata de uma atmosfera imersiva no hall de entrada do salão e no interior do salão uma galeria com as principais obras da artista, como forma também de ampliar as conexões entre o trabalho de Flávia com aqueles que por ali passarem. Então, pensando na integração, foi feito no segundo mês de 2023, um jantar com convidados selecionados e a artista Flávia Junqueira, envolta por obras da mesma.
As instalações de Flávia Junqueira proporcionam uma imersão no universo lúdico e onírico que acessamos visualmente através de suas fotografias. Neste projeto comissionado pelo Frade Villas, Junqueira retomou o espelho – elemento já presente em obras anteriores, relacionado aos jogos perceptivos próprios dos parques de diversões – para explorar as relações entre o interior da residência e seu exterior, marcado pela natureza deslumbrante da região. Refletidas no interior desta cobertura, a paisagem marinha e as formas da flora tropical compõem um ambiente que é povoado pelos balões coloridos e translúcidos da artista que, nesta versão, trazem palavras que convidam à reflexão e ao sonho, algo muito bem-vindo neste período do ano, de encerramento de ciclos e recomeços. A atmosfera festiva da instalação se expande para a área externa da cobertura, onde mais balões vêm habitar a paisagem, agora vista sem a mediação dos espelhos, em toda sua magnitude.
O tema da memória é recorrente da poética de Flávia Junqueira. Além do trabalho com os elementos que remetem às lembranças da infância, a artista investiga as inscrições do tempo sobre a materialidade do mundo. Uma certa idealização do passado convive com as marcas desta passagem do tempo, que inspiram no espectador um olhar arqueológico na relação com o objeto de arte e com seu próprio passado. A obra proposta para o FRAD.E parte da apropriação de um barco encontrado em uma ilha de pescadores próxima ao complexo, sobre o qual serão instalados dois cavalos de carrossel. Tal apropriação objetiva trazer para o interior do FRAD.E um pouco da história do território no qual o empreendimento está localizado, aprofundando poeticamente a proposta impregnação do complexo pelas paisagens naturais e culturais do entorno.
Nascida em 1985 em São Paulo, Flávia Junqueira entrou com força no cenário internacional pelo frescor de suas abordagens. Junqueira nos apresenta cenas onde se conjugam o real e o fictício, o físico e o alegórico, o presente e o passado, o adulto e a criança; onde a história se torna memória. Ela é a criadora de paisagens imaginárias caprichosas e festivas, nas quais mergulhamos no cenário distante da cultura nacional, sentindo o peso da história, ouvindo o silêncio do passado. Em suas obras, os balões são os performers que sobem ao palco, seja qual for o teatro, seja na rua ou no céu.
Flávia Junqueira constrói um trabalho que investiga aspectos relacionados à representação e suas ligações com a história. Embora extremamente pictórica, suas fotografias têm um interesse muito mais escultural. Ao ocupar lugares históricos com balões, criam-se delicadas celebrações da impermanência. Junqueira dá vida a esses lugares buscando uma configuração espacial, ainda que aparentemente lúdica; a artista constrói uma crítica da (dis)funcionalidade dos sistemas artísticos, arquitetônicos e políticos através de sua delicada metáfora. Uma paisagem transitória que representa um salto no vazio, uma reflexão sobre a superficialidade dos tempos atuais e um estímulo para que tudo passe.
Do que ele está fugindo?
De um modo de vida melancólico e ansioso, que foi engendrado pela concepção moderna de tempo linear e evolutivo. Acredito que esse ideal de progresso nos distancia do aqui e agora da existência, condição para uma vida alegre e lúdica.
Cite um exemplo do salto no vazio que a sociedade deve dar nos próximos anos.
Precisamos nos livrar das promessas da modernidade que, obviamente, não serão cumpridas. Nossa fé nesse modelo de desenvolvimento tem sérias implicações que, além de subjetivas e existenciais, são econômicas, políticas e ecológicas.
Qual obra de arte melhor representa o salto para o vazio?
Estou pensando nos slides de Carsten Höller, que não só representam um salto no vazio, mas também nos desafiam a “saltar”. Com seu trabalho, Höller nos lembra que somos um corpo e que a arte pode ser um espaço privilegiado para exercitarmos outros olhares sobre o mundo.
INSTALAÇÃO
11 de outubro de 2022 – horários a definir
Sala de estar
EXPOSIÇÃO
Junqueira no Liceu
De 26 de outubro a 03 de novembro de 2022
Saló dels Miralls
A imaginação pode nos fazer mergulhar em estados e dimensões que muitas vezes não conseguimos controlar e, mesmo diante de situações e imagens conhecidas, nos lançamos em viagens pelas memórias e sensações ativadas por essas condições. Essa pode ser uma cortina que se abre para nossos olhares, frequentemente adormecidos, ou anestesiados pelo cotidiano, mas que anseiam por lançar-se em revoadas pelos espaços da memória e da imaginação.
Nascem deste desejo por romper a rigidez em uma possível compreensão racional dos espaços, e a busca por questionar a hierarquia de nossas informações, as proposições de Flávia Junqueira nos convidando a novas miradas por lugares que julgamos conhecer e, por histórias que julgamos dominar. Voar, como sonhar, é preciso… e é possível quando somos impactados e deslocados de nossas certezas imediatas e não questionadas.
As pesquisas de Flávia Junqueira debruçam-se sobre o espaço teatral há mais de uma década, incluindo sua experiência inicial com cenografia e arquitetura teatral. A essa somou-se a formação em artes visuais, e o interesse pelo meio fotográfico que se tornou, de início, a linguagem com a qual produziu registros de conjuntos de objetos familiares, e do universo infantil, com séries como Na Companhia dos Objetos, de 2008, e A Casa em Festa, de 2009/2010, ou ainda Empilhamento, 2010.
Nestas séries explorava, pelo acúmulo de objetos/ brinquedos, as possibilidades de imagens do universo infantil, inserindo-os em ambientes de sua casa, criando um estranhamento nesse espaço da convivência familiar. Nesse cenário ela se insere literal e, corporalmente, performa para a câmera, em uma encenação dentro desse universo de aparente ingenuidade e de fragilidade, mas assumidamente pervertendo uma primeira leitura nessa direção.
Retomar esse percurso cronológico do início dessa linha de pesquisa, na produção da artista propõe, para além de biografar, revelar as origens da produção aqui apresentada, afirmando e articulando-a, ao longo dessa década, com as imagens aqui apresentadas.
A sequência das séries acima é produzida em deslocamentos geográficos e culturais para, respectivamente, Paris e Donestk. Na primeira cidade o encontro impactante com o peso da tradição, a memória de um passado presente a todo momento e lugar, em seus descolamentos pela cidade, se apresenta, frequentemente, como explicitação de finalizações identificáveis nas camadas de ruínas – destruição – que simultaneamente constroem essa paisagem aos olhos da artista.
É em Paris, com a série Ele ainda não está aqui, de 2011 que os balões já se apresentam como a materialização dos questionamentos sobre impermanência, perenidade, pelo caráter efêmero da matéria, ainda que ela se apresente na leveza e inocência, claro que apenas aparentes, desses globos coloridos. Inicia-se, na vivência parisiense, a prática de trabalho com esses elementos e a consolidação dessa reflexão permanente sobre o contraste acerca da leveza e da beleza, em contraposição ao efêmero e à noção de destruição e ruína.
Importante mencionar, ainda, que é daquele momento o início da prática coletar informações e referências visuais e, a partir do qual ela produz pela primeira vez a construção de um mapeamento exaustivo: o dos carrosséis que se espalham por Paris. Também desse procedimento decorre um olhar nostálgico em sua alusão ao universo colorido, fantasioso e mágico, infantil que nos remete ao tempo e a uma inocência perdida, que se busca resgatar.
Já o seguinte destino, nesse processo de deslocamento que Flávia Junqueira empreende esses referenciais parisienses se conectam com uma realidade verdadeira e assumidamente da ruína, imagem da destruição de sonhos revolucionários que a paisagem de restos soviéticos, em Donetsk apresentam, com força e vitalidade. O primeiro espaço de encenações – o Centro Cultural – surge como o campo de batalha do qual se erguerá essa peregrinação pela busca de afirmação da relevância de um trabalho que se debruce sobre a preservação de uma memória dos espaços teatrais, que se tornará fundamental na produção da artista.
Nesse raciocínio estabelecer uma prática de produzir uma condição teatral que insere um questionamento de noções de tempo e espaço, de lugar e pertencimento, passa constituir um dos focos de sua pesquisa que se tem ampliado nessas duplas dimensões, como assunto e tema, mas, principalmente, pela mescla de referências de memória (passado) e ações (presente) afirmando uma simultaneidade de tempos. Para tanto Flavia trabalha com referências cenográficas, de iluminação, e por que não dizer, de uma coreografia de cores e formas, com os balões, produzindo uma imagem que congela – em sua simultaneidade temporal – esse bailado orquestrado no espaço teatral: palco e plateia são, duplamente, o lugar da encenação o que nos coloca, como observadores e atores coadjuvantes desse jogo teatral no qual ela brinca conosco.
Essa ‘fotografia encenada’, como pode ser comumente identificada a linhagem na qual Flavia Junqueira tem desenvolvido sua produção pode ser entendida como uma prática artística que possibilita à artista adentrar espaços e situações detentores de uma história – por sua longevidade, ou inserção na cena cultural, ou ainda relevância arquitetônica… como espaços relevantes – e, de lá, oferecer sua visão, construindo o inusitado olhar proposto para aqueles que observam esses novos “retratos” dessa realidade espacial, agora subvertida pela presença dos pequenos e multicoloridos objetos que, em seu estranhamento ao serem para lá deslocados, nos remetem, ainda, aos ciclos da passagem do tempo.
O espaço teatral dominado pela presença dos inúmeros e festivos balões, que subjugam a inicial seriedade, habitualmente atribuída a esses ambientes se vê, também, pervertido por essa presença colorida, imponente, mágica e livre, com as mais distintas e possíveis alusões pessoais ao universo infantil, ainda que quase óbvio, mas que se amplia, também, ao de todas as formas de festividades e celebrações, marcadamente dos ‘cumple años’, a que nenhum olhar consegue ficar insensível e impassível.
Esses processos e olhares motivaram e, pode se dizer mesmo, provocaram e instigaram Flavia Junqueira a empreender uma dupla jornada em busca dos teatros históricos no Brasil, mapeando e produzindo suas encenações perturbadoras da ordem estabelecida pela visão comum desses sisudos ambientes e históricos edifícios que testemunharam um século e meio dessa arquitetura teatral, espalhada pela vastidão continental do país, da floresta amazônica aos atuais centros econômicos e políticos brasileiros.
Nessa perspectiva em uma década de buscas e de debruçar-se sobre esses espaços teatrais, nos quais intervém, simultaneamente à produção do mapeamento, a artista consolidou sua relação com as investigações motivadoras de proposições das encenações que realiza em cada uma das distintas condições desses ambientes culturais.
O convite para a realização da primeira empreitada europeia da série Revoada – identificação dos trabalhos realizados com os teatros – realizada no Grand Teatre del Liceu reveste-se, portanto, de importância e de muitas perspectivas desafiadoras para Flavia que, ao atravessar o Atlântico com seu ‘mapeamento’ iniciaria uma nova viagem, e de direção inversa na busca por esses espaços teatrais que inspiraram e motivaram aqueles que, no Brasil, foram objeto de sua pesquisa.
Dados como o isolamento social decorrentes da pandemia, as comemorações dos cento e setenta e cinco anos do “Liceu”, o início de um debruçar-se sobre a espacialidade referencial dos teatros europeus, entre outros, constituem-se em diferencial para essa nova etapa das Revoadas, e da pesquisa da artista, incitando, ainda a que novas possibilidades se abram para o trabalho.
A proposta, nesse sentido, ampliou-se de uma simbólica dimensão, ganhando força para “saltar no vazio” e, lançando-se em “mares nunca dantes navegados”, propor que a encenação/ ocupação/ intervenção ganhasse novo impulso, e desafiasse outras possíveis percepções para o trabalho. A imponência relevância e significado dessa realização, pela ocasião de iniciar o programa “Salto al vacio”, colocou-se como uma provoacação para trilhar novos caminhos, experimentar – e compartilhar – novas percepções e sensações, razões mais do que suficientes para dar passos em outras direções e, provocar, tanto quanto provocar-se, a caminhar, fazendo novos caminhos.
Como uma ruptura em suas práticas artísticas – tendo como base a encenação fotográfica – Flávia propõe aqui um chamamento à participação, acrescentando novas dimensões às esperadas fotografias, como eram até então produzidas. Encenar a situação de suspensão em que se encontram os balões, nesse espaço do Liceu, que é um lugar com história, e no qual a história também se faz nos contares de histórias, pareceu poder ficar reduzido diante da perspectiva de propor uma camada a mais de experiências sensíveis.
Pela primeira vez a proposta ampliou-se com o convite para que da “fotografia encenada” pudesse ser realizada uma intervenção no espaço e que essa pudesse ser vivenciada por uma parcela de público que lançaria olhares, mas penetraria com seus corpos essa revoada de cores e formas.
O espaço do Liceu ganhou por alguns dias, já que da preparação encenada para as fotos ampliou-se temporalmente a permanência e, numericamente, a presença dos balões para que pudessem receber e abraçar esses novos interlocutores: o “respeitável público” que, por alguns momentos teve a experiência de mergulhando na revoada de “objetos familiares”, e caminhando por entre o emaranhado de fios coloridos, atravessar a barreira da imagem para estar instalado na “companhia dos objetos”.
O maravilhamento da experiência de adentrar em um espaço onírico, instaura uma nova condição para o espaço, mas também para esses distintos públicos, incluindo-se aqui os funcionários do Liceu que atuaram, ou não, diretamente na produção e realização da ação, mas que como o público externo, desvelava o espaço, tratado de forma inusitada, com outros olhares.
Oswald de Andrade, um dos mais importantes intelectuais e criadores brasileiros, do século XX, propositor da ideia de antropofagia na cultura brasileira, insistia na necessidade de “rever tudo” e, dessa maneira, abrir-se para as experiências, deglutindo e repropondo visões do mundo.
Podemos nos apropriar de sua proposição, que há cem anos nos provoca e ver como Flavia Junqueira nos leva a experimentar e a nos lançarmos nesse desafio: sonhar, como forma de voar para novas perspectivas, nos lançarmos em permanentes desafios, buscar formas para superar o peso do recente passado. O sonho, o desejo e a paixão materializam-se como proposição de enfrentar os “inimigos invencíveis”, que nos assolam no dia a dia, mas que a arte nos alimenta a vencer.
A artista Flávia Junqueira usa a fotografia encenada em espaços arquitetônicos de reconhecida importância histórica para criar atmosferas de sonho e fantasia. O resultado são imagens inspiradas no cinema, no teatro, em locais de memória e de relevância histórica como palácios, ruínas e até mesmo ambientes abertos, como florestas. A própria teatralidade existente nos espaços vira elementos pictóricos que contrastam com cores fortes que ajudam a compor a obra final.
Espaços feitos para durar que se contrapõem à fragilidade dos balões instalados nesses locais. Essas junções, improváveis para muitos, dão abertura a novas possibilidades e à criação de um mundo imaginativo criado por Flávia onde habitam também suas memórias infantis. Seu objetivo não é negar a realidade, mas sim evocar novas camadas, muitas vezes ocultas nos espaços e nos objetos. Como se entrássemos em um mundo de fantasia habitado por balões, brinquedos, cores e muito do que é lido como infantil, universo que não raro desprezado, considerado até mesmo medíocre por alguns, mas que na obra de Flávia recebe protagonismo, construindo a narrativa de que tudo tem sua relevância, que conexões entre mundos e épocas são possíveis. Quase um manifesto que afirma a cada construção que o POP não precisa assassinar o clássico para coexistirem.
No domingo, dia 13/11, às 11h, na Casa das Rosas o Artista e Curador Thiago Cóstackz e a Artista Flávia Junqueira realizaram uma performance inédita; uma junção da instalação chamada “Revoada” com a performance SY Ibirapi.
A instalação “Revoada” é uma nova intervenção que dialoga com a obra “Samauma”, já instalada na Casa das Rosas, causando uma imersão no universo da artista, trazendo essa tridimensionalidade e atmosfera de encantamento presentes nas fotografias. Há nas duas obras elementos em comum, como a ocupação do espaço, a infância, a magia e o balão como elemento central e protagonista.
Instalação de Flávia Junqueira Inaugura Galeria Suspensa, Projeto Cultural do Pátio Higienópolis em Parceria com o Paço das Artes
Com acesso gratuito, obras inéditas da artista plástica ocuparam o Vão Central do shopping e a entrada do Paço das Artes.
Cerca de 150 balões de resina cristal fazeram parte da instalação “REVOADA#3”, da artista plástica e fotógrafa Flavia Junqueira, que inaugurou dia 02 de abril, o projeto Galeria Suspensa, resultado da parceria Pátio Higienópolis e Paço das Artes.
No shopping, a instalação ocupa o vão central, área de cerca de 250 metros quadrados, com cerca de 50 de altura, que torna a obra visível de todos os andares. No Paço das Artes, na entrada do espaço expositivo, na mesma data, estavam em exposição duas fotografias encenadas em grande formato.
Drone Farol Santander Porto Alegre, 2021
por Flávia Junqueira
1’16”
Vídeo de Registro da Exposição
por Flávia junqueira
1’30”